quarta-feira, 13 de março de 2013

Argentino Jorge Mário Bergoglio é escolhido novo papa

Atualizada às 16h38

Agência Efe

O arcebispo de Buenos Aires Jorge Bergoglio adota o nome Francisco I como novo papa


O cardeal argentino Jorge Mário Bergoglio foi eleito nesta quarta-feira (13/03) o novo papa da Igreja Católica. A partir de hoje, o arcebispo de Buenos Aires adotou o nome de Francisco.

O anúncio foi feito às 16h14 (de Brasília, 20h14 de Roma) pelo cardeal francês Jean-Louis Tauran. A fumaça branca que indicou o consenso entre os 115 cardeiais eleitores, atingido na quinta votação, saiu da chaminé da Capela Sistina às 15h06 (horário de Brasília).

Aos 76 anos, Bergoglio é o primeiro papa latino-americano da história. 

Em sua primeira aparição, ele pediu uma oração ao papa emérito Bento XVI, que renunciou no dia 11 de fevereiro.

Na Argentina, Bergoglio é conhecido pela oposição ao kirchnerismo. Apesar de se mostrar preocupado com os mais pobres, ele não é adepto da Teologia da Libertação, corrente que, com base em ideias marxistas, defende que o clero atue prioritariamente servindo os mais pobres.

O novo papa já difundiu diversas declarações contra o aborto e a eutanásia. Além disso, embora ressalte que homossexuais merecem respeito, Bergoglio é contra o casamento gay.

Bergoglio não consta na lista SNAP (sigla para Rede de Sobreviventes Abusados por Padres), organização que acusa doze cardeais de não terem sido rigorosos o suficente em relação a clérigos pedófilos.


Fonte: Opera Mundi

sábado, 9 de março de 2013

XVII Jornadas sobre Alternativas Religiosas da América Latina



XVII Jornadas sobre Alternativas Religiosas da América Latina
11 a 14 de novembro de 2013
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil


As Jornadas sobre Alternativas Religiosas da América Latina são um evento regular, bienal, da Associação de Cientistas Sociais da Religião do Mercosul. Sua 17ª. edição ocorre em Porto Alegre, Brasil, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A organização local do evento é assumida pelo Núcleo de Estudos da Religião (NER), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFRGS.

Com abertura prevista para a noite de 11 de novembro de 2013, o evento se desenrolará nos três dias seguintes, contando com atividades diversificadas: conferências, mesas-redondas, grupos de trabalho, conversas sobre religião e arte, além de uma programação cultural.

O tema desta edição é “Pluralismo e interculturalidade: fluxos e itinerários religiosos”, com o objetivo de destacar a preocupação em focarmos movimentos e dinâmicas sociais e culturais nos quais a religião participa. Essa preocupação abriga tópicos, abordagens e recortes bastante variados, como pode ser constatado pela observação do conjunto de atividades que compõem a programação.

Três objetivos motivam este evento, todos eles conectados com as referências latino-americanas. Primeiro, avançar no conhecimento sobre fenômenos e processos que envolvem a religião e ocorrem na América Latina, de um modo que demonstre a conexão entre as pesquisas científicas e as realidades sociais. Segundo, projetar tais realidades da América Latina dentro de debates com alcance global, incentivando diálogos no âmbito da comunidade acadêmica mundial. Terceiro, contribuir para a construção de uma perspectiva latino-americana, algo que traduza ao mesmo tempo a situação do continente nas configurações globais e as particularidades de nossa visada para a compreensão do mundo.

Neste site poderão ser encontradas, além de dados sobre as atividades que compõem a programação, indicações sobre formas e procedimentos de participação, e informações para facilitar a chegada e o deslocamento pela cidade e a universidade que sediam o evento. Ao longo dos meses que antecedem as Jornadas, o site detalhará a programação e oferecerá materiais que contribuirão para a consecução dos objetivos do evento. Além de apresentar na sessão “organizando o evento” algumas das atividades envolvidas com a preparação da atividade.

Estejam todos convidados a participar das XVII Jornadas sobre Alternativas Religiosas da América Latina e a se associarem à Associação de Cientistas Sociais da Religião do Mercosul.

Que Papa os católicos querem?


Santidade, credibilidade, responsabilidade, carisma, amabilidade e uma série de características são essenciais para montar o perfil do novo líder de uma instituição milenar, a Igreja Católica Apostólica Romana

Créditos: News.va
Que Papa os católicos querem?
A partir de terça-feira, 12, os 115 cardeais com direito a voto devem escolher o novo líder da Igreja Católica. A data do conclave foi marcada na sexta-feira e o novo Papa será escolhido quando obtiver 2/3 dos votos. A escolha do novo Papa depois da renúncia de Bento XVI, que passou a ser considerado Papa Emérito, é um momento histórico para a Igreja Católica. O mundo está com os olhares voltados ao Vaticano. Mas, qual o perfil que deve ter o novo Papa? O novo líder da igreja católica terá a responsabilidade de dar continuidade ao legado dois mil anos da Igreja, de levar a evangelização, de ser convidativo, comunicativo e representar uma imagem de credibilidade, responsabilidade e espiritualidade. 

O historiador Rodrigo Coppe Caldeira, professor da PUC – MG, diz que o perfil buscado é aquele que mescle o carisma de João Paulo II com a profundidade teológica de Bento XVI, uma tarefa difícil, segundo o professor. “O novo Papa, também precisa ser um comunicador, com entrada e compreensão da mídia e das novas mídias e redes sociais, ter linguagem clara, convidativa; ter experiência profunda de Deus e capacidade de escuta, ter conhecimento profundo da Cúria Romana, seus problemas e coragem e vontade política para levar adiante as reformas necessárias. Também vigor físico é necessário para um papa dos tempos atuais,” disse.

Já Dom Antônio Carlos Altieri, Arcebispo de Passo Fundo, destaca que o perfil do novo Pontífice deverá centrar-se na liderança, além de ser uma pessoa com grande coração e santidade, para que assim, possa enfrentar os impactos das contra marchas do mundo. Sobre a possibilidade da escolha de um líder com perfil mais transformador, Dom Altieri considera os valores que a Igreja prega, sempre voltados à defesa da vida humana. “Um Papa nunca irá ceder a valores que fogem ao que a Igreja prega para ser popular, isso não vai acontecer. Mas é evidente que diante da situação que a Igreja se encontra caberá uma troca de ideias. Se chegar a conclusão que caberá a valorização da cultura, então a escolha se dará em um perfil que atenda essa formação. Se descobrirem que nesse momento o que mais choca é a questão econômica, a desigualdade social, a pobreza e a fome, tem que encaminhar quem está a frente da Cáritas mundial, ou que vive em países mais pobres, então são vários aspectos para analisar.”, disse.

O perfil do novo Papa deve ser uma pessoa que saiba dialogar, mas levando a palavra da Igreja é o que afirma o Padre Mateus Danieli, da Catedral Nossa Senhora Aparecida,. Segundo ele, Bento XVI conseguiu fazer isso, porém foi mal interpretado, pois as pessoas imaginam que dialogar significa aceitar e acatar tudo que elas querem, mas o dialogo para um Papa significa saber levar a palavra da Igreja para a sociedade, apenas transmitir a opinião da instituição.

Para a Irmã Amélia Weschenfelder, coordenadora das pastorais na comunidade do Colégio Notre Dame, o Papa devia ser uma pessoa de Deus e voltada ao povo, que entenda a sociedade, a nova situação da família e que possa dar uma resposta religiosa para toda essa situação que a Igreja enfrenta. “Ele deve ser uma pessoa de grande abertura e de visão ampla. Ele pode ajudar para trazer novas diretrizes para conduzir o povo de Deus e para conservar os seus fiéis. Deve atender as inspirações de Deus e do espirito santo e deve escutar a voz do povo e de toda a pirâmide que conduz a igreja, para que ela passe pelos caminhos mais seguros. O Papa deve ser uma pessoa carismática, pois isso atinge o povo”, completa a Irmã. A Ir. Amélia integrou um grupo de Ir. de Notre Dame que discutiu a espiritualidade e a evangelização no ano passado, em Roma.

Não se deve esperar mudanças fundamentais, mas apenas modificações mais externas, de ser de se comunicar, aspectos da organização do modo de apresentação publicamente, a legalizar da cúria, agilizar a forma de governo com sistemas mais modernos e mais rápidos, ressalva o professor de Teologia e Filosofia do IFIBE e do ITEPA, Padre Alexander Mello Jaegr. Contudo frisa que naquilo que é fundamento, a fé a doutrina, não haverá mudanças.

Amor
O amor é uma característica fundamental, resalta Padre Mateus, para conduzir a instituição e para transmitir isso para a sociedade. “Precisamos de uma pessoa que tenha essa postura de amabilidade, que manifeste seu amor, seu carinho com a sociedade. Além disso, precisamos de uma pessoa que venha conduzir a Barca de Vidro que tenha esse amor, o amor que Cristo teve,” disse. Ainda destaca que o amor é importante para entender a nova estrutura que a sociedade vem assumindo.

“Mão Forte”
A historiadora e professora do curso de história da UPF, Gizele Zanotto, observa a escolha do novo Papa através de dois vetores. O primeiro deles é pulso para dirigir uma instituição que passa por problemas sérios relacionados a escândalos políticos, financeiros e sexuais. Por isso, a necessidade de reordenar os elementos da sua estrutura interna. Por outro lado, Zanotto ainda chama atenção para o trânsito religioso constante. “A queda no número de fiéis, de multiplicação de grupos e congregações internas que procuram dar conta das demandas dos crentes a partir de novas propostas de vivência e significado da fé, entre outros, são situações nada simples que demandam do novo pontífice um posicionamento referente à dinâmica e a legitimidade da Igreja em uma perspectiva de gestão a médio e longo prazos”, afirma. Assim, o novo pontífice terá de ser sensível a ambas as realidades para dar conta de situações sérias que demandam posicionamentos e soluções. Com isso, o maior desafio, é dar conta das realidades internas e externas, locais e mundiais, estruturais e teológicas, estatais e subjetivas nas quais uma postura simplista pode ser incompatível, insustentável e mesmo incoerente.

Missão
Padre Alexander, destaca a resposabilidade que o Papa deve ter, pois erstará a frente de uma instituição milenar, uma das instituições mais antigas que conhecemos e com uma presença no mundo fortíssima. "É preciso levar em conta que a cada seis pessoas no mundo uma é católica, são mais de 1 bilhão e 200 milhões de pessoas católicas no mundo. Então o Papa tem a responsabilidade de dirigir e passar uma bagagem milenar, a Igreja contribuiu para a construção do mundo e para solidificar uma série de valores. A ética, por exemplo, é um dos valores construídos em cima dos valores evangélicos, a manutenção da escrita foi mantida graças a Igreja, pois os textos antigos foram reproduzidos através dos manuscritos, antes da existência da imprensa, então isso contribuiu para a continuidade e aperfeiçoamento da escrita. As primeiras universidades também foram criadas pela Igreja. Se não tivéssemos a Igreja não teríamos universidades. As organizações, a forma de organização politica, o conceito de direito, tudo está vinculado ao trabalho da Igreja de 2000 mil anos. A assistência, os hospitais, as escolas, a educação formal, orfanatos, todas essas organizações são heranças que a Igreja tem e o Papa terá que manter e administrar.

O historiador Rodrigo reforça isso, “a igreja possui uma longa tradição, um conhecimento sobre o ser humano, uma sabedoria de vida, que não podem ser jogados fora ou adaptados de maneira barata para agradar os fiéis e os possíveis fiéis,”. Desse modo, os dois estudiosos afirmam que é vital para a Igreja um Papa que preserve sua história e não perca a sua identidade. Rodrigo exemplifica, mostrando que se houvesse uma maior abertura, ou até mesmo adaptação por parte da instituição com comportamentos que as sociedades assumem no decorrer da história, ela teria desaparecido por completo. Mas ressalta, que isso não quer dizer que ela não se transforme. “Da mesma forma, se ela não se transforma, ela também pode virar museu,” afirma.

“As instituições religiosas em geral carregam uma aura de "tradição" que lhes implica simbolicamente serem portadoras de "verdades". Ao tornar tais "verdades" questionáveis, mutáveis, adaptáveis, desestabiliza-se o próprio edifício teológico que as sustenta e, em consequência, sua organização, estrutura, hierarquia, ritos e cultos - ao fim desse processo, se questiona a própria necessidade e existência institucional. Nesse sentido, entre a demanda pela mudança e a realidade de sua aplicação, há uma discrepância que longe está de ser resolvida, não tanto pela carga de tradição e “verdade”, mas pela infinidade de situações à qual a Igreja Católica, como entidade supranacional, teria de se adaptar.”, explica Gizele Zanotto.

O professor Pe Alexander, salienta que o Papa terá que afirmar apenas as concepções que a Igreja tem segurança. Algumas delas, hoje são apenas moda, que podem mudar. Assim o novo Pontífice tem o compromisso com a verdade e deve defender concepções, mas o principal é o compromisso com a verdade. Essa característica é uma das que faz a Igreja ser tão cobrada quando ela erra.

Uma nova perspectiva
Visando uma nova perspectiva, voltada à construção da solidariedade, Luiz Costella, coordenador da Caritas Diocesana de Passo Fundo, considera que para os organismos e pastorais sociais, bem como atuantes em obras sociais que a Igreja organiza e anima, seria importante que o novo Papa fosse um articulador de forças, visando a construção de um mundo com relações solidárias, incentivando as pequenas comunidades. A abertura ao ecumenismo, ao respeito pelas ideologias e as diferenças, são aspectos importantes para a Igreja observar. Assim o coordenador, ressalva que o perfil desse novo líder deve ser focado na humildade, na valorização de todos, inclusive daqueles que se afastaram da Igreja, e em especial as mulheres.

Fonte: O Nacional

Conheça o manifesto de teólogos da libertação ao pré-conclave


  Por Dermi Azevedo
Documento assinado por teólogos como Leonardo Boff e o bispo d. Pedro Casaldáliga começou a ser elaborado em outubro do ano passado, simultaneamente na Europa, América Latina, EUA e Canadá. Texto diz que “Cúria Romana necessita de uma reforma mais radical baseada nas instruções e na visão do Vaticano II”.

Já chegam a duas mil as adesões de teólogos católicos de todo o mundo ao documento publicado por ocasião dos 50 anos do Concílio Vaticano II e cuja redação final está sendo encaminhada aos 115 cardeais que, a partir de segunda-feira (4), começam a escolher o sucessor do papa Bento XVI.
O manifesto começou a ser elaborado em outubro do ano passado, simultaneamente, na Europa, na América Latina, nos Estados Unidos e no Canadá. Entre os seus autores, estão incluídos Leonardo Boff e o bispo d. Pedro Casaldáliga.
O contexto de sua publicação (concebida em meio a uma grave crise na Igreja, poucos meses antes da renúncia de Bento XVI) reforçou a decisão dos teólogos de enviá-lo aos cardeais eleitores. Esta é a íntegra do documento:
"Muitos ensinamentos do Concílio Vaticano II não foram concretizados ou apenas parcialmente traduzidos na prática. Isto é devido à resistência de alguns ambientes, mas também sobretudo, em certa medida, à não resolvida ambiguidade de alguns documentos conciliares. Uma das principais causas da estagnação moderna depende do não entendimento e dos abusos no exercício da autoridade na nossa Igreja. De modo concreto os seguintes temas exigem uma urgente reformulação.
O papel do Papado necessita de uma clara redefinição baseada nas intenções de Cristo. Como supremo pastor, como elemento unificador e principal testemunha da fé, o Papa contribui de modo essencial para o bem da Igreja Universal. Mas a sua autoridade não deveria obscurecer, diminuir nem suprimir a autentica autoridade que Cristo deu diretamente a todos os membros do Povo de Deus.
Os bispos são vigários de Cristo e não vigários do Papa. Eles possuem a responsabilidade direta sobre o povo de suas dioceses e uma responsabilidade compartilhada com os outros bispos e com o Papa, do âmbito da comunidade universal da fé.
O Sínodo central dos bispos deveria assumir um papel mais decisivo no planejamento, na orientação e no crescimento da fé em nosso mundo tão complexo.
Concilio Vaticano recomendou a colegialidade e a corresponsabilidade em todos os níveis. Isto não foi transformado em ação. Os vários organismos presbiterais e conselhos pastorais previstos pelo Concilio, deveriam envolver os fiéis de modo mais direto nas decisões relativas à doutrina ao exercício do ministério pastoral e à evangelização no âmbito da sociedade secular.
O abuso de preencher os postos de guias da Igreja apenas com candidatos com uma determinada mentalidade é algo que deveria ser eliminado. Em vez disto, deveriam ser formuladas e monitoradas novas normas assegurando que as eleições para estas tarefas sejam conduzidas de modo correto, transparente e o mais democrático possível.
A Cúria Romana necessita de uma reforma mais radical baseada nas instruções e na visão do Vaticano II. A Cúria deveria limitar-se aos seus úteis papéis administrativos e executivos.
A Congregação para a Doutrina da fé deveria ser ajudada por comissões internacionais de peritos escolhidos independentemente em função de sua competência profissional. Essas não são todas as mudanças necessárias. Devemos considerar ainda que a implementação dessas revisões estruturais exigem uma elaboração detalhada e relacionada com as possibilidades e com as limitações das circunstancias presentes e futuras. Destacamos porém que as reformas sintetizadas a cima são urgentes e a sua concretização deveria iniciar-se imediatamente.
O exercício da autoridade na nossa Igreja deveria seguir o padrão de abertura, responsabilidade e democracia encontrados na sociedade moderna. A liderança deveria ser correta e confiável, inspirada na humildade e no serviço, com uma transparente solicitude para com o povo, em vez de se preocupar com as normas e a disciplina; anunciar Jesus Cristo que liberta; ouvir o espirito de Cristo que fala e age por meio de todos e de cada um".

quinta-feira, 7 de março de 2013

A Bíblia, o humor e o nosso presente histórico


Em uma conversa no restaurante Gambrinus, no Mercado Público de Porto Alegre, Flávio Aguiar fala de seu novo livro "A Bíblia segundo Beliel" ("um livro cômico para ser levado a sério", segundo o autor), da origem de seu interesse pelos textos bíblicos, da presença do humor nestes textos, da importância de voltar a rir de coisas sobre as quais não se riem mais e das perspectivas de fim de mundo que pairam sobre o nosso presente histórico, em especial sobre o Vaticano.

Porto Alegre - Flávio Aguiar passou muitos anos lendo e estudando a Bíblia – ou as Bíblias, como prefere dizer – como pesquisador e professor de teoria literária. Mais da metade das literaturas e das artes que estudamos, assinala, são incompreensíveis sem um conhecimento mínimo das diversas Bíblias. A relação de Flávio Aguiar com os textos bíblicos começou, na verdade, desde a infância, quando ele compreendeu que “a verdadeira Bíblia era sexo, ação e violência o tempo inteiro”. “Era melhor que um faroeste”, brinca. Mais tarde, no Canadá, descobriu com o professor Northrop Frye que as Bíblias também foram escritas com humor. “De repente tudo isso se materializou numa reescritura do que eu lera e me inspirara na minha vida de professor e crítico literário”, conta. Foi assim que nasceu A Bíblia segundo Beliel (Boitempo), que trouxe Flávio Aguiar ao Brasil para dois lançamentos, em Porto Alegre (1º) e em São Paulo (12), neste mês de março.

Em uma conversa no restaurante Gambrinus, no Mercado Público de Porto Alegre, Flávio Aguiar fala da origem de seu interesse pelos textos bíblicos, da presença do humor nestes textos, da importância de voltar a rir de coisas sobre as quais não se riem mais e da perspectiva de fim de mundo presente nos dias de hoje. “É um livro cômico para ser levado a sério. Ele trata de coisas sérias”, resume. 

O acaso sorriu para essa intenção do autor. A Bíblia segundo Beliel e suas histórias profundamente humanas surgem no momento em que a Igreja Católica está mergulhada em uma profunda crise moral e mesmo programática. Os pecados que habitam o Vaticano e que agora vem a público embalados sob a forma de escândalos não são inéditos. A história do homem e das igrejas dos homens está repleta deles. Lembrando uma passagem de Isaías, um dos livros bíblicos preferidos de Flávio Aguiar:

“Toda a cabeça está enferma, e todo o coração abatido. Desde a planta do pé até ao alto da cabeça, não há nele nada são; tudo é uma ferida, uma contusão, uma chaga entumecida, que não está ligada, nem se lhe aplicou remédio para sua cura, nem foi suavizada com óleo. Vossa terra está deserta, vossas cidades abrasadas pelo fogo...” (Isaías, 1,5)

Como é que começou esse seu interesse pela Bíblia?

Começou quando eu era criança. Eu lia a Bíblia não só porque estudava em um colégio jesuíta (o Anchieta, o velho Anchieta da rua Duque de Caxias, em Porto Alegre). Mesmo sendo criança e com um lado um pouco carola, devo dizer, eu logo compreendi que a Bíblia - a verdadeira Bíblia, não as adaptações que se faziam – era sexo, ação e violência o tempo inteiro. Era melhor que faroeste, melhor que revista pornográfica, o que não depõe em nada contra a Bíblia. Ela é um livro profundamente humano sobre coisas humanas, mas infelizmente a maioria das pessoas se convenceu de que ela é algo intocável, que é uma redoma que não pode ser tocada e que só pessoas iluminadas podem interpretá-la devidamente. Não. As bíblias – e vou falar dela no plural mesmo – foram escritas para serem lidas por todos. Ela tem uma mensagem aberta para crianças, adolescentes, pessoas maduras, pessoas idosas, para todas as crenças e todas as raças. Eu consegui, por alguma alquimia, me imbuir desse espírito. 

Agora, houve um momento chave na vida, que foi quando eu fui aluno de Northrop Frye, um professor extraordinário de teoria literária na Universidade de Toronto, no Canadá. Além de ser um professor extraordinário e especialista em temas bíblicos, ele me convenceu que a Bíblia tinha sido escrita com humor também. Tudo isso se materializou na ideia de escrever uma história baseada nos relatos bíblicos para que nós hoje, no século 21, pudéssemos rir de coisas sobre as quais não se riem mais. E eu penso que isso é algo muito salutar.

Que coisas, por exemplo?

Vou dar um exemplo da Bíblia clássica. Quando Jesus está no templo e os sacerdotes que se consideravam guardiões das escrituras começam a apertá-lo, ele responde: Vocês estão vendo esse templo? Eu posso destruí-lo e reconstruí-lo em três dias. Os doutos sacerdotes respondem: mas que louco, que idiota, em outras palavras é claro, mas dizem isso. Na verdade, Jesus está tirando sarro da cara deles. Está dizendo: vocês não estão entendendo nada do que está acontecendo. O que está acontecendo aqui é outra coisa. Há outro momento, belíssimo, em que ele está na casa desses doutores e eles resolvem tratá-lo mal. Neste momento entra casa adentro uma prostituta, que dizem ser Maria Madalena – há controvérsia a respeito -, põe uma bacia com água aos pés de Jesus, derrama lágrimas nesta bacia, lava os pés dele e os enxuga com o próprio cabelo. É uma cena de um erotismo extraordinário, além de deixar aqueles doutores todos com a cara no chão.

Outro exemplo pode ser encontrado em Jeová, o criador do Gênesis, que tem um lado meio neurótico. Ele criou algo sobre o qual está completamente inseguro. Então ele fica tentando refazer tudo: é dilúvio pra cá, é fogo pra lá, e destrói Sodoma e Gomorra, e promete pra Jó e faz o contrário, e chama Lúcifer para tentar Jó...Ou seja, Jeová deveria estar em um divã psicanalítico, de preferência com o doutor Freud, que é da tribo.

Então, o livro, apesar de ter um viés satírico, pretende também falar de coisas sérias, digamos. É um livro sério, na verdade...

É um livro cômico para ser levado a sério. Ele trata de coisas sérias. O último capítulo, por exemplo, é o fim do mundo. Eu não vou falar sobre isso porque como o livro foi recém-lançado ainda existem muitas pessoas que ainda não conhecem o seu final. Eu não vou falar sobre isso, mas é o fim do mundo. Hoje, nós nos deparamos com uma perspectiva de fim de mundo, seja do ponto de vista supersticioso, religioso – como a teoria maia do fim do mundo -, seja do ponto de vista científico – é a crise climática, o fim da atmosfera. 

O fim do mundo foi, em primeiro lugar, um tema da minha geração que cresceu sob a ameaça da terceira guerra mundial, da guerra fria, que iria acabar com o mundo. Hoje, a ameaça da guerra fria está à sombra, mas existe a ameaça de uma guerra nuclear, por exemplo, no Oriente Médio, seja de que ponto de vista se queira encarar. O fim do mundo se tornou hoje uma visão palpável. Como disse um grande amigo meu, Saul Leblon, que escreve na Carta Maior, nós, mais velhos, não veremos este momento, mas nós já estamos olhando nos olhos daquelas crianças que se defrontarão com o momento em que o mundo tomará um rumo, o rumo da continuidade ou o da destruição e da calamidade, em função das grandes ameaças que pairam sobre nós, pelos problemas ambientais, por questões sociais não resolvidas. 

Eu diria, então, que o livro trata de temas bíblicos, mas é um livro realista, que trata de questões sobre o nosso presente histórico e nossa vida cotidiana.

E parece haver também um fim do mundo pairando sobre a própria igreja...

Eu diria que as trombetas do apocalipse soaram para, pelo menos, uma certa igreja, que é herdeira do imenso trabalho conservador e reacionário de João Paulo II para reverter a tendência progressista anterior. Eu diria que esta igreja está fadada a desaparecer ou a fazer a própria igreja desaparecer. Esse é o desafio para o próximo conclave: ou continuar mantendo essa cúpula fechada do Vaticano sobre a qual pesam gravíssimas acusações de corrupção em todos os sentidos, inclusive no sentido cristão. Essas acusações vão desde a pedofilia até a corrupção envolvendo dinheiro. Não vamos esquecer as palavras de Cristo: ai daquele que escandalizar um destes pequenos, melhor que amarrasse uma pedra no pescoço e se jogasse no mar. 


Fotos: Flávio Aguiar e Paulo Neves no lançamento do livro, sexta-feira (1º) à noite), na Palavraria Livros & Café, em Porto Alegre - Divulgação/Palavraria (http://palavraria.wordpress.com) 

sábado, 2 de março de 2013

Análise: Fissura no papado expõe possibilidades de renovação


RODRIGO COPPE CALDEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

A renúncia de Bento 16 acontece na esteira de uma história que se desdobra nos séculos passados, tendo como desfecho fundamental o Concílio Vaticano 2º (1962-5).

Muito se especula sobre os motivos que levaram à decisão. Porém não somos capazes de compreendê-los se os isolamos do contexto conturbado vivido pela igreja universal nas últimas décadas.
O ato de Ratzinger abriu, certamente, uma fissura na compreensão cristalizada do papado. Nada mal para um papa enquadrado categoricamente como "conservador".

Mas, como apontou o historiador Danielle Menozzi, não seria correto compreender o evento como "revolucionário" nem como uma possível dessacralização da figura do papa.

O conceito de "revolução", que tem seu uso inicial no campo astronômico em Copérnico, transposto para o mundo político e religioso, tem seus limites.

Sobre a possível dessacralização, uma renúncia papal não teria a força necessária para enfraquecer um símbolo religioso tão presente no imaginário católico.

Ao contrário, poderia redefinir positivamente a mística que o envolve. Só poderemos avaliar o evento profundamente a partir de uma distância temporal adequada --e isso, pensando em Igreja Católica, pode levar décadas.

Mesmo tendo em vista as posições do historiador, talvez a renúncia de Bento 16 esteja colocando a igreja um passo à frente no caminho da renovação iniciado no século passado com o concílio de João 23.
Especialmente em temas como a reforma da cúria e do papado, possibilitando uma nova arejada na organização vaticana.

A interpretação da renúncia, portanto, deve ser balizada pela história da igreja nos últimos 50 anos, com várias idas e vindas que marcam o processo de recepção das determinações conciliares e do espírito que as insinuou.

A grande interrogação de fundo continua sendo a recepção do concílio --matéria que foi objeto de inúmeros posicionamentos de Joseph Ratzinger durante seu papado e centro de rusgas e controvérsias hermenêuticas entre historiadores, teólogos e os posicionamentos de Roma.

De que forma a renúncia se enquadra na conjuntura conturbada da recepção do Concílio Vaticano 2º? Esta é a pergunta dos historiadores. De hoje e do futuro.
RODRIGO COPPE CALDEIRA é professor e historiador do Departamento de Ciências da Religião da PUC de Minas.